terça-feira, 17 de setembro de 2013

Protestos de junho - Congresso frustra manifestantes


Três meses após os primeiros protestos que tomaram as ruas do País em junho último, movimentos da sociedade civil e deputados federais do Ceará ouvidos pelo Diário do Nordeste reconhecem que pouco se caminhou no Congresso Nacional para responder a série de reivindicações apontadas nas manifestações populares que eclodiram durante a Copa das Confederações sediada no Brasil. Parlamentares e militantes afirmam que só a pressão popular poderá dar continuidade à chamada pauta positiva do Congresso.

Apesar de a reforma política ter sido amplamente cobrada nos protestos de junho, o deputado Edson Silva diz que não percebeu a reivindicação Foto: Viviane Pinheiro

Após o esfriamento dos ânimos dos protestos, votação na Câmara Federal do último dia 28 de agosto livrou o deputado Natan Donadon (sem partido-Roraima) de ter o mandato cassado. Isso após ele ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) - sem mais direito a recursos - e estar preso há mais de dois meses. Após a votação, que se deu de maneira secreta, os mesmos deputados federais aprovaram o voto aberto para todas as decisões do Congresso como resposta à repercussão negativa do caso Donadon.

Na avaliação do deputado Artur Bruno (PT), a Câmara Federal e o Senado ainda são majoritariamente conservadores e só funcionam após tensionados pelos eleitores. "Toda a sociedade queria a cassação (do Donadon), mas a Câmara não cassou. Na semana seguinte, reviu sua posição e aprovou o voto aberto", exemplifica. O petista completa: "Lamentavelmente o Congresso não mudou muito. Ele toma uma atitude hoje sob pressão e, quando esfria, volta ao seu comportamento regular, que é não votar as grandes necessidades da população".

Tema que vem sendo pautado em Brasília há mais de 15 anos, a reforma política tornou-se uma das bandeiras dos protestos que ocuparam as ruas no mês de junho. Longe do consenso das lideranças partidárias, a pauta novamente foi para escanteio e deve ser engavetada. Dessa forma, nas eleições de 2014, nenhuma mudança significativa no sistema político e eleitoral deve ser implementada. "Eu não sou otimista com a composição da Câmara dos Deputados que temos hoje. Haverá uma outra mudança para não mudar (...) A reforma política é a reforma das reformas", defende Artur Bruno.

Limitação
Mesmo admitindo a limitação das votações dos últimos meses, o deputado José Airton Cirilo (PT) diz que os deputados e senadores têm dado respostas às reivindicações sociais. "O Congresso tem estado em sintonia com as reivindicações da sociedade e tem votado matérias polêmicas como a PEC 37, chamada PEC da Impunidade. Houve um apelo e a Casa acabou votando essa matéria de acordo com as reivindicações da sociedade". No entanto, pondera: "A reforma política é a dívida que este Congresso tem com a população".

Questionado se a votação que livrou Natan Donadon da cassação reflete o corporativismo entre os deputados, José Airton rechaça a hipótese. "Tem que se respeitar a opinião de cada parlamentar. Nem sempre o parlamentar vai votar de acordo com a pressão, senão vai virar Inquisição", responde, comparando a situação com o processo do Mensalão, que, segundo justifica, teria sido um julgamento político e injusto.

Apesar de a reforma política ter sido amplamente cobrada por alguns movimentos sociais e manifestantes, o deputado Edson Silva (PSB) garante que não se deu conta da bandeira durante as manifestações populares que ocorreram no País. "Em nenhum momento eu vi reivindicação de reforma política. O que mais a sociedade precisa é de reforma tributária. Questionaram altos salários (do Legislativo e do Judiciário), a morosidade da Justiça...", alega.

Na opinião do pessebista, a reforma tributária não deslancha no Congresso, porque não interessa nem aos grandes empresários nem à uma parcela de parlamentares cujas campanhas são financiadas pelo alto empresariado. Entretanto, o deputado é otimista em relação à atuação das bancadas federais, mesmo reconhecendo falhas na postura dos congressistas. "Tivemos um tropeço que não cassou um deputado que já é condenado pelo Supremo, uma decisão que não se sustenta. Foi mais uma resposta (do Congresso) às ações do STF. O voto aberto só foi aprovado porque houve um clamor público", avalia o parlamentar.

Contraponto
No 7 de Setembro que passou, entidades da sociedade civil retomaram as pautas reivindicadas em junho. Em sua 19ª edição, o Grito dos Excluídos, organizado por setores de base da Igreja Católica em parceria com movimentos sociais, foi às ruas como um contraponto à independência comemorada nesta data. "Neste ano, o Grito quis dialogar com as manifestações de junho e denunciar grandes obras, principalmente o Acquario, que beneficiam pequenos grupos", declara Francisco Vladimir da Silva, da Articulação das Pastorais Sociais, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e organismos da Arquidiocese de Fortaleza.

Francisco Vladimir diz acreditar que parte da pauta positiva aprovada em Brasília se deu por pressão dos movimentos populares. "A avaliação que a gente está tendo é que esse momento deu uma animosidade e uma visibilidade aos problemas sociais que estão à tona. Mas não mudou muita coisa. O povo foi às ruas, disse que quer mudanças, mas o que está sendo pautado ainda não satisfaz", opina.

O militante da Articulação das Pastorais Sociais ressalta que, embora a reforma política tenha sido discutida de maneira massiva nos últimos meses, o tema já é cobrado pelos movimentos sociais há alguns anos. "Tem que ser feita muita pressão. Não podemos sair das ruas. Os movimentos sociais históricos têm que continuar na luta, mas os jovens que saíram às ruas em junho também devem entender que (o protesto) não pode se encerrar naquele junho. É só assim que eles (parlamentares) vão trabalhar", pontua.

Fiscalização
Longe das frentes diretas de manifestação, o comerciante Francisco de Assis Soares aposta em uma fiscalização contínua da sociedade civil na execução de recursos públicos. Através da Ação Cearense de Combate à Corrupção, ele acompanha licitações e gastos das prefeituras cearenses e ministra oficinas no Interior do Estado para que lideranças comunitárias ampliem o controle social à execução orçamentária dos municípios.

Francisco de Assis Soares explica que, quando são encontradas irregularidades nas licitações, a associação encaminha a denúncia ao Ministério Público para que o órgão faça a representação na Justiça. "Se no Ministério Público não andar, enviamos ao Conselho Nacional do Ministério Público", destaca Soares, defendendo que o cidadão e os movimentos da sociedade organizada se apropriem dos instrumentos legais de controle social.

De acordo com o ativista, a mobilização que estourou em junho deste ano até chegou a interferir na ordem dos trabalhos do Congresso, mas o efeito foi limitado. "De certa forma, as manifestações fizeram uma pressão. O Senado estava trabalhando até na sexta-feira, mas uma semana depois, já havia só três senadores no plenário", explana.

Um dos mecanismos utilizados por Francisco de Assis para monitorar a aplicação de recursos públicos é a Lei de Geral de Acesso à Informação, que garante a todos os cidadãos e entidades o direito de requerer informações a órgãos público. O prazo para que as instituições respondam a demanda é de 20 dias.

Sem respostas, atos perdem adesão
Nos protestos marcados para o dia 7 de Setembro, o número de participantes foi bem inferior ao das manifestações que iniciaram em junho. Para o cientista político Valmir Lopes, da Universidade Federal do Ceará (UFC), as reivindicações surgiram de modo espontâneo e apartidário. Num segundo momento, aponta, com a apropriação de agremiações políticas e movimentos sociais, houve um recuo de uma parte dos manifestantes, cujas pautas eram diversas e não se encaixavam nas bandeiras das legendas e grupos específicos.

Para o professor Valmir Lopes, a violência presenciada nos atos, tanto da Polícia como dos manifestantes, reduziu o público dos protestos Foto: NATINHO RODRIGUES
Conforme explica o professor universitário, o desdobramento da politização do movimento afunilou as pautas e reduziu as propostas. "No terceiro momento, tem uma vanguarda de manifestantes que quer delimitar a pauta e fechar em um tema, e isso impede que outras pessoas participem. Esse tipo de movimento acaba se tornando expressão de um autoritarismo. Nesse sentido, muitos se afastam", opina Valmir Lopes.

Para o cientista político, alguns atos de violência presenciados durante os protestos - tanto dos manifestantes como da Polícia - podem ter afastado uma parcela de pessoas que foi às ruas expressar sua insatisfação com os rumos do cenário político no País. "Aliado a esse fechamento de pauta, muito específico e politizado, tem a presença de atos de violência, componentes para que esses movimentos fiquem mais isolados, expressão da unicidade. Muitos não se identificam com esse tipo de manifestação", pondera.

Já a cientista política Patrícia Teixeira, professora da Universidade de Fortaleza, defende que a cobertura dos veículos de comunicação - que pode ter priorizado a divulgação de atos de vandalismo em detrimento da pauta de reivindicações - e a própria sensação de insegurança da Capital cearense afastaram muitos manifestantes das ruas. "Alguns pais influenciaram filhos a não participarem, porque hoje temos uma violência muito grande. Ainda acredito que a mídia seja uma das principais influências, porque focou a questão da baderna e do vandalismo, esquecendo a pauta em si", justifica.

Na opinião da especialista, as manifestações ganharam grande adesão em junho, dentre outros motivos, pela repercussão internacional que os atos geraram e pela empolgação do momento político, que reuniu muitos jovens que nunca tinham participado de protestos. "Muitos adolescentes estavam empolgados a participar dos movimentos como eventos, mas depois houve o transbordamento das pautas, a obrigação das tarefas cotidianas", analisa Patrícia.
 
 
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Gomes Silveira
Da Redação
Fonte:DN

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