Espaços sem estrutura adequada, pessoal terceirizado e não capacitado e carência nas oportunidades de formação educacional e profissional são alguns pontos focados. No entanto, a superlotação, que potencializa motins e rebeliões, é apontada como a mais grave. De acordo com o documento, o Ceará registra 202,8% a mais de internos do que a capacidade dos centros educacionais. Para cada vaga, existem mais dois. O Estado ocupa a quarta posição no ranking brasileiro. O primeiro lugar é do Maranhão. Lá, o percentual beira o absurdo, com 458,9% para mais, seguido pelo Mato Grosso do Sul, com 354,1%, que registra índice pouco superior a Alagoas, com 324,7%, onde três convivem num espaço para um.
Olhar
"O excesso de lotação nas unidades compromete severamente a qualidade do sistema socioeducativo, aproximando-o perigosamente e, por vezes superando o contexto das celas superlotadas que costumeiramente se vê no sistema prisional", analisa o estudo Um Olhar mais Atento às unidades de internação e semiliberdade para adolescentes, datado de maio deste ano.
O juiz da 5ª Vara da Infância e Juventude, Manuel Clístenes, afirma que os dados não surpreendem. Para ele, há um conjunto de fatores que contribuem e agravam a cada dia o quadro: a desestrutura familiar; o crescimento avassalador do tráfico de drogas, com destaque para o acesso dos pobres a drogas de forte potencial de dependência química, como a cocaína, seja na forma de pó ou ´pedra´ (crack); a falta de investimentos e projetos sociais voltados para a criança e o adolescente e fracasso total das medidas socioeducativas em meio aberto, previstas no ECA, sob o comando dos municípios, que não dão à questão um tratamento adequado. "No caso do Ceará, não vejo qualquer luz no horizonte. A situação somente tende a piorar", avalia.
Educação
O juiz defende investimento pesado na educação e na saúde. A primeira, com a inserção da educação em tempo integral. A segunda, com planos de prevenção contra as drogas e hospitais/clínicas voltadas para dependes químicos. No caso, da medidas de meio fechado, diz, a construção de novos centros educacionais, uma vez que estes investimentos que mencionou são de médio e longo prazo. "Desta maneira, mesmo que tudo se iniciasse hoje, ainda teríamos um tempo até obtermos resultados".
A promotora de Justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público do Ceará (MPE), Antônia Lima Sousa, afirma que "é com enorme pesar e preocupação que vejo a situação do adolescente infrator no nosso Estado".
De acordo com ela, a superpopulação nos centros educacionais, principalmente as internações, com duas vezes a sua capacidade é muito preocupante. "Desse modo, não há como se falar em socioeducação, como propõe o ECA e a nova Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase)", aponta a promotora.
Ela aponta que atendimento integrado, como propõe o ECA, é a solução. Neste sentido, uma articulação feita numa parceria do Ministério Público, Defensoria Pública, Poder Judiciário, Prefeitura e entidades da sociedade civil visa à criação da Comissão Intersetorial para a implantação do Núcleo Integrado de Atendimento (NAI). A proposta, informa, é a reestruturação do Projeto Justiça Já, que dará mais celeridade e equilíbrio aos casos de adolescentes apreendidos.
A promotora diz não acreditar que as medidas socioeducativas em meio fechado (internação e semiliberdade) seja a solução, porque entende que mais de 75% dos atos infracionais são contra o patrimônio, logo a raiz do problema não é jurídico, é social. "Vivemos numa cidade extremamente excludente, e o Sistema de Justiça deve levar em conta esta realidade, no momento de aplicação das medidas socioeducativas, vez que os nossos adolescentes que infracionam estão nas áreas de menor índice de desenvolvimento humano como nos bairros das regionais V e VI", argumenta.
A coordenadora do Núcleo de Atendimento da Defensoria Pública na Infância e Juventude (Nadij), Juliana Andrade, vê com preocupação não só a superlotação das unidades, mas a questão dos educadores sociais terceirizados e sem capacitação. Ela ainda admite que é de conhecimento os casos de maus-tratos nos garotos internados em alguns centros, sendo constatados violações graves de direito.
Neste sentido, defende concurso público criterioso para a seleção de pessoal que atua nesses centros, assim como uma fiscalização rigorosa por parte de uma comissão formada por representantes da rede de garanti de direitos. "Isso é urgente", diz.
LÊDA GONÇALVES
REPÓRTER
Mil pessoas para nove centros em Fortaleza
Ampliação da rede socioeducativa da Capital, com um centro socioeducativo prestes à inaugurar na Sapiranga e outro em construção no Canidezinho; aumento da regionalização das unidades socioeducativas; além da construção de duas unidades em Sobral e em Juazeiro; fortalecimento da corresponsabilidade dos atores do Sistema de Garantia de Direitos na área socioeducativa, do trabalho socioeducativo em meio aberto (município); implantação do Núcleo de Atendimento Jurídico aos Adolescentes, em parceria com a Defensoria Pública, e de varas especializadas da infância e juventude pelo Poder Judiciário são algumas ações apontadas pela Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social do Ceará (STDS) como medidas a curto e médio prazos para combater a superlotação e garantir direitos dos interno no Centros Educacionais.
Unidade socioeducativa situada na Sapiranga está pronta para ser inaugurada ainda neste segundo semestre de 2013, o que vai ampliar a rede
A STDS reconhece o número excessivo de interno por unidades. Atualmente, são mil distribuídos nos nove centros socioeducativas somente em Fortaleza. Cada um com capacidade para 60 adolescentes. Segundo a secretaria, 844 colaboradores, formando em Organizações Não Governamentais (ONG). Na avaliação do órgão, um processo sistemático de capacitação para profissionais que atuam nos centros educacionais vem sendo realizado via Programa de Apoio às Reformas Sociais do Ceará (Proares).
Apesar dos problemas, o estudo do Conselho Nacional do Ministério Público considerou que no quesito salubridade das unidade socioeducativas, o Ceará e São Paulo são destaques. Segundo o documento, 89,9% dos centros no Estado e 91,3%, em São Paulo, estão em boas condições de estrutura e adequação.
Roubo, tráfico e homicídios, nesse ordem, são três principais atos infracionais que mais levam os adolescentes para as unidades de internação e semiliberdade no Brasil. O Ceará acompanha os dados gerais.
SAIBA MAIS
O que diz o ECA
Artigo 123. A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração.
Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes: permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável; habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade. Também é direito: receber escolarização e profissionalização; realizar atividades culturais, esportivas e de lazer.
Além de ter acesso aos meios de comunicação social; receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje; manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade; receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade. O Estatuto da Criança e Adolescente deixa claro que em nenhum caso haverá incomunicabilidade.
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Da Redação
Gomes Silveira
Fonte:DN
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